quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Bolha dos Mares do Sul


Uma das mais famosas histórias sobre bolhas especulativas é a da South Sea Company no que ficou conhecido como a Bolha dos Mares do Sul. A empresa britânica em si não é um grande escândalo em si, criada para explorar o comércio ultra marítimo. Mas o uso da empresa para pagar dívidas da coroa inglesa, a especulação com as ações da companhia e as práticas corruptas de seus dirigentes a tornariam um caso de mania e bolha financeira.
A companhia foi criada em 1711 pelo ministro das finanças Robert Harley. Os lucros seriam utilizados para diminuir a dívida e o déficit público. Mas esse objetivo secundário acabou assumindo uma importância maior, com a companhia sendo utilizada para “privatizar” a dívida pública, com a empresa assumindo parte da dívida pública a juros de 6% a.a. e com os detentores de títulos de dívida gradativamente se tornando acionista da South Sea Company. Além disso, a empresa recebia subsídios do governo por ter contraído a dívida estatal. Em troca, a South Sea Company recebeu o monopólio da exploração do comércio com as colônias espanholas, além de ser protegida de concorrência por meio de tarifas de importação.
Em uma época de baixo desenvolvimento do mercado acionário, as ações da South Sea Company eram acompanhadas com muito interesse por investidores atraídos pelo que se dizia da empresa. Como não havia muita informação sobre o que se passava em outro continente, passava-se uma ideia de abundância de ouro e prata nas colônias espanholas, que poderiam ser trocados por produtos de baixo valor. Além disso, havia o boato de que o rei Felipe V da Espanha iria abrir os portos para os negociantes ingleses. É um tanto incrível imaginar como as pessoas acreditavam que o rei espanhol faria isso. O comércio era possível, mas apenas escravos e mais um navio para comércio de produtos com elevada tributação por parte dos espanhóis.
Ajudou para a promoção da empresa o fato de figuras importantes, inclusive o rei George I, terem recebido ações da empresa em doação, conseguindo apoio e divulgação dessas figuras. Além disso, havia condições vantajosas para a aquisição da empresa, como necessidade de uma entrada de apenas 20% do investimento e prazo de 16 meses para pagar o saldo devedor. Não bastasse isso, a empresa ainda concedia empréstimos para quem precisasse, empréstimos financiados por emissão de novas ações, em algo parecido com um esquema Ponzi. Por fim, mas não menos importante, a empresa distribuía vultuosos dividendos de tempos em tempos e manipulava os registros contábeis, além de também falsificar a existência de algumas ações. O objetivo disso não era uma boa gestão financeira, e sim inflar o preço das ações. A loucura chegou a um ponto que um banqueiro holandês afirmaria que parecia que todos os loucos escaparam do hospício ao mesmo tempo.
Com tudo isso, o preço da ação saiu de £ 100 no começo de 1720 para £ 900 no mesmo ano, enriquecendo enormemente o presidente da companhia (John Blunt) e outros acionistas como os que faziam parte da realeza. Porém, eventualmente as ações começariam a se desvalorizar, muito por conta das vendas de ações por parte dos acionistas privilegiados, inclusive John Blunt. Muitos outros investidores também realizaram lucros e outros precisaram vender ações da South Sea Company para cobrir prejuízos em outras empresas bolha, que funcionavam de maneira parecida com a South Sea Company.
A queda nos preços foi tão espetacular quanto a alta, o preço rapidamente voltando de onde nunca deveria ter saído. A ruína que se seguiu entre os pequenos investidores foi tão grande que um investidor declararia que parecia que estava fora de moda não estar falido.
Estourada a bolha, começou a busca pelos culpados. Foi sugerido que, por ser um crime inédito e não previsto nos códigos, os culpados fossem colocados dentro de um saco e jogados no rio (como isso tudo ocorreu em Londres, o candidato natural seria o Tâmisa). Isso não chegou a ser colocado em prática, mas a ruína financeira dos principais culpados foi bastante considerável, alguns mantendo apenas 3% do patrimônio após a punição. Porém, outras pessoas também tiveram perdas gigantescas, com investidores perdendo o que seria equivalente hoje a centenas de milhões de libras. Até sir Isaac Newton, famoso físico, perdeu uma montanha de dinheiro, equivalente a £ 3 milhões.
Diante de preços sempre ascendentes, os investidores foram atraídos para as ações da empresa, mesmo que não houvesse fundamento econômico para essa alta (na verdade, não havia muita capacidade de analisar essa questão pela maioria dos investidores). Muitos até acreditavam que não havia muita razão para essas altas, mas confiavam que conseguiriam vender as ações a um preço superior a um “tolo maior”. Porém, como sempre ocorre, chegou uma hora em que os tolos foram ficando escassos, resultando em perdas para os que não saíram a tempo. Apesar de ter ocorrido a pouco menos de 300 anos atrás, essa história ainda é bastante contemporânea e pode voltar a ocorrer no futuro.

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